Tradicionalmente, os defensores do batismo infantil (ou pedobatismo) alegam que sua prática remonta aos apóstolos. Entretanto, não há provas para essa afirmação. Não existe nenhuma evidência clara para o batismo infantil anterior ao terceiro século. Até mesmo a declaração de Agostinho de que o batismo infantil era um “costume firmemente estabelecido” na igreja está imprecisa. Tão tardios quanto os escritos de Agostinho (final do quarto e início do quinto século), muitos pais da igreja também não praticaram o batismo infantil ou nem mesmo eles próprios receberam o batismo até se tornarem adultos. Somente após a morte de Agostinho, no século V, poderíamos nos referir ao batismo infantil como um costume firmemente estabelecido. Para entendermos essa questão precisaremos abordar dois aspectos: (1) Nós devemos discutir qual foi o motivo para o batismo infantil criar raízes no terceiro século e tornar-se uma pratica generalizada por volta do quinto século. (2) Nós devemos mostrar que o batismo infantil não era a prática dos cristãos primitivos no período entre a época dos apóstolos e o século III. Entretanto, antes de fazermos essas duas coisas, devemos ter em mente a ideia principal que parece dirigir o argumento pedobatista ao longo da história: Se o batismo infantil foi uma adição tardia, então por que não houve controvérsia sobre sua introdução dentro das igrejas? A resposta a essa questão é dupla: em primeiro lugar, não há evidência clara do batismo infantil anterior ao terceiro século, e o pedobatista deve lidar com isso. Quaisquer discussões sobre a razão pela qual o batismo infantil veio à cena com pouca oposição registrada, não obscurece o fato de que o batismo de crentes é a prática evidente antes do século III e o batismo infantil não é. Em segundo lugar, Tertuliano argumentou contra a introdução do batismo infantil, o que nós discutiremos em breve. Agora, voltando ao aspecto (1), por que o batismo infantil foi introduzido no terceiro século? Sobre isso, há duas coisas que temos de discutir: primeiro, o sistema catecúmeno, e segundo, a questão da condenação infantil e a regeneração batismal. O sistema catecúmeno já estava estabelecido no início do século II. Nesse sistema, as pessoas se submetiam a um período de instrução depois da conversão e antes do batismo. Os primeiros pais da igreja colocaram tanta ênfase na instrução na fé como algo precedente ao batismo, que a maioria dos convertidos se submeteu a meses ou anos de instrução catequética antes de se batizar. Muitos dos mais conhecidos pais da igreja submeteram-se a tais catequeses e não receberam o batismo até a maioridade, mesmo sendo filhos de pais cristãos. Isso inclui, entre outros, homens como Atanásio, Basílio, Clemente de Alexandria, Hipólito, Gregório de Nissa, Crisóstomo, Jerônimo e o próprio Agostinho. [1] Se o batismo de crianças era um costume desde o tempo dos apóstolos, certamente esses homens teriam sido batizados antes da idade adulta. No entanto, esses homens foram resultados do sistema catecúmeno. Eles foram catecúmenos que se submeteram a instrução na fé por muitos anos antes de serem admitidos no batismo. Assim, dado esse contexto, como o batismo infantil veio a substituir o sistema catecúmeno? Foi simplesmente assim: As pessoas começaram a crer na errônea doutrina da condenação dos infantes e na regeneração batismal, o que logo se tornou comum nas igrejas. Agora, analisando o aspeco (2), nós devemos lidar com as provas existentes, anteriores ao terceiro século, de que o batismo era administrado somente aos crentes e não aos infantes. [2] O melhor lugar para começar é na igreja primitiva do século II. Toda referência que nós encontramos na igreja do segundo século apresenta a confissão de fé como uma qualificação essencial para o batismo. [3] A melhor e mais antiga fonte sobre o batismo de crentes é o Didaquê (ou “O Ensino dos Doze Apóstolos” A.D. 100-110). Este documento entra em mais detalhes sobre o batismo do que qualquer outro tratamento do século II. O Didaquê não estabelece apenas as qualificações morais para quem está prestes a se submeter ao batismo, mas também exige que o candidato ao batismo jejue por um ou dois dias. [4] Paul K. Jewett pergunta, “como é que vamos explicar a omissão de qualquer referência ao pedobatismo neste manual primitivo sobre o uso adequado do batismo? É difícil imaginar tal omissão ocorrendo sobre a tutela de Católicos Romanos, Anglicanos, Luteranos, ou mesmo Presbiterianos, Metodistas ou congregacionais…. Não é, portanto, altamente implausível que o Didaquê tenha sido produzido por uma comunidade de Pedobatistas primitivos que apenas nada disseram sobre o batismo infantil?” [5] Todas as outras referências ao batismo no século II rendem os mesmos resultados. Pedobatistas têm há muito tentado atribuir um sentido incorreto a Justino Mártir como se ele ensinasse o batismo infantil quando ele fala de “muitos homens e mulheres que, tornando-se discípulos de Cristo desde criança, permanecem incorruptos até os sessenta e setenta anos”. [6] No entanto, nenhum Batista negaria que se uma criança é madura o suficiente para ser um “discípulo de Cristo”, e é um, então ela pode ser admitida para o batismo. Longe de suportar o batismo infantil, o comentário de Justino Mártir suporta o batismo de discípulos. Muitos autores pedobatistas, tais como Joachim Jeremias, têm dito que Irineu cria no batismo infantil, por causa de sua declaração (c. A.D. 180) de que, através de Cristo, pessoas de todas as idades são renascidas, incluindo infantes. [7] Entretanto, como argumenta Everett Ferguson, “Antes de nos precipitarmos em aceitar uma referência ao batismo infantil aqui, devemos ser cautelosos”. Ferguson argumenta que Irineu usa o termo “renascer” (renascor) para a “a obra de Jesus de renovação e rejuvenescimento concretizada pelo seu nascimento e ressurreição, sem qualquer referência ao batismo. . . . A vinda de Jesus trouxe um recomeço a toda a raça humana. Ele santificou todas as idades da vida. Aceitar sua renovação ao ser batizado é outra questão e cai fora do âmbito desta passagem”. [8] Essa é a interpretação padrão batista articulada por autores tais como Hezekiah Harvey and Paul King Jewett. No entanto, essa visão sobre Irineu é também compartilhada por pedobatistas como Kurt Aland. [9] A medida que avançamos para o início do terceiro século, nós encontramos Tertuliano, que escreveu o primeiro tratado completo sobre batismo, De baptismo. Favorecendo fortemente o sistema catecúmeno, ele acreditava que as pessoas deveriam adiar o batismo até que elas fossem instruídas na fé por um longo tempo: “Por conseguinte, tendo em conta as circunstâncias e a vontade, até mesmo a idade de cada pessoa, o adiamento do Batismo é mais vantajoso , em particular, no entanto, no caso de crianças. . . . O Senhor, na verdade diz: ‘Não as impeçais de vir a mim’ (Mt 19). Que venham, então, enquanto elas estão crescendo; venham enquanto estão aprendendo, enquanto elas estão sendo ensinadas para onde devem vir; deixai-as tornarem-se cristãs, quando elas foram capazes de conhecer a Cristo. Por que se apressa a idade da inocência para a remissão dos pecados?” [10] Esta passagem mostra que Tertuliano é contrário ao batismo infantil, precisamente porque ele é a favor do batismo de crentes. Batistas, é claro, concordam que o batismo infantil criou raízes no terceiro século. Pais da igreja como Cipriano, Orígenes e Agostinho o aprovaram. No entanto, Orígenes foi defensivo sobre o assunto, dizendo que o batismo de infantes “é uma coisa que causa frequentes questionamentos entre os irmãos”. [11] Essa declaração trabalha contra o argumento pedobatista de que ninguém protestou contra a introdução gradativa do batismo infantil. Não há nenhuma evidência direta para a afirmação de que o batismo infantil era praticado nos primeiros dois séculos da igreja cristã. Pelo contrário, toda a evidência estabelece crentes como os únicos sujeitos aptos para o batismo antes do século III. Quando colocado ao lado dos dados do Novo Testamento sobre o batismo, isso demonstra que o batismo apostólico era para crentes somente. Texto de Matthew Pinson Fonte: http://www.fwbtheology.com/was-infant-baptism-practiced-in-early-christianity/ Tradução/adaptação: Samuel Coutinho ________
[1] HARVEY, Hezekiah. The Church: Its Polity and Ordinances (Philadelphia: American Baptist Publication Society, 1879; repr. Rochester, NY: Backus, 1982), 211; ARGYLE, A. W. “Baptism in the Early Christian Centuries,” inChristian Baptism, ed . A. Gilmore (Chicago: Judson, 1959), 187, 202-03, 208. [2] Para um dos melhores e mais sucintos tratamentos da visão dos cristãos primitivos sobre o batismo, ver Paul King Jewett, Infant Baptism and the Covenant of Grace(Grand Rapids: Eerdmans, 1978). 13-43. Ver também Steven McKinion, “Baptism in the Patristic Writings,” em Thomas R. Schreiner e Shawn D. Wright, eds., Believer’s Baptism: Sign of the New Covenant in Christ(Nashville: B&H Academic, 1006), 163-88. [3] Ver, p. ex., A Epístola de Barnabé (c. A.D. 120-130), o qual advoga o batismo de crentes somente: “Nós descemos para a água cheios de pecados e impurezas, e retornamos dando frutos em nossos corações, temor e esperança em Jesus no Espírito” (Ante-Nicene Christian Library, Apostolic Fathers, I, 121). Obviamente, infantes são incapazes de exibir este tipo de comportamento. Outro exemplo é encontrado no Shepherd de Hermas, escrito na metade do Segundo século. Hermas coloca o arrependimento como condição para o batismo (Jewett, 40). [4] “Antes de batizar, tanto aquele que batiza como o batizando, bem como aqueles que puderem, devem observar o jejum. Você deve ordenar ao batizando um jejum de um ou dois dias” (Didache, 7.4). [5] Jewett, 40-41. [6] Citado em Harvey, 202. [7] JEREMIAS, Joachim. Infant Baptism in the First Four Centuries. Tradução: David Cairns (Philadelphia: Westminster, 1962), 73. [8] FERGUSON, Everett. Baptism in the Early Church: History, Theology, and Liturgy in the First Five Centuries (Grand Rapids: Eerdmans, 2009), 308. [9] Harvey, 203-04; Jewett, 25-27; Kurt Aland, Did the Early Church Baptize Infants? Traduzido por G. R. Beasley-Murray (Philadelphia: Westminster, 1963), 58-59. Para um tratamento batista primitivo de Irineu similar a este, ver John Gill, Infant Baptism a Part and Pillar of Popery (Philadelphia: American Baptist Publication Society, 1851), 22-23. Ver também “The Baptismal Question in the Light of Scripture and Church History,”Freewill Baptist Quarterly 26 (1859), o qual questiona, “Se o batismo infantil era praticado por Cristo e seus apóstolos e no primeiro e segundo séculos, não é extremamente estranho que nossos amigos pedobatistas não possam encontrar nenhuma prova disso, mas só essa passagem de Irineu, que, afinal, não diz nada sobre o batismo?” (128). [10] TERTULIANO. Tertullian’s Treatises: Concerning Prayer, Concerning Baptism. Tradução: Alexander Souter (New York: Macmillan, 1919), 69. [11] Citado em Jewett, 30. |
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Outubro 2024
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