Vez ou outra nos deparamos com certo revisionismo histórico acerca da história e origem dos batistas. Um ponto que sempre é levantado, é a questão do batismo por imersão. Esta marca dos batistas seria um ponto doutrinário que “comprovaria” que os batistas seriam “orfãos” de origem nessa questão, sendo que até 1644, com a "primeira confissão" de fé Batista de Londres, esse ponto seria “esquecido” na história e devemos aos batistas particulares a retomada dessa doutrina bíblica e batista. Mas será mesmo? No entanto, como já dito, essa afirmação de que os batistas particulares teriam retomado a imersão, sendo que até esta data todos grupos cristãos, reformados ou não, praticariam a afusão ou aspersão parece um crédito equivocado. Para começar, antes dos batistas ascenderem como movimento, os anabatistas eram praticantes da imersão, em 1523 um livreto anabatista denominado Sum of the Holy Scripture de língua alemã e traduzido por Simon Fish em 1529 para o inglês afirmava que “As águas do batismo não tiram nossos pecados como se fossem águas preciosas... nós somos mergulhados na água... prometeu fazer quando somos atizados e tem o mesmo significado para nós, somos mergulhados na água”(1), veja bem que o batismo é mergulhar na água, até mesmo Mennon Simons, líder anabatista conhecido como menonita dizia que “Depois de termos procurado tão diligentemente, não encontramos outro batismo além da imersão em água, que seja aceitável perante Deus e mantido em Sua Palavra”(2). Além desses, temos ainda, para citar por agora, o testemunho de um luterano e um católico sobre o batismo por imersão dos anabatistas. Primeiramente o luterano Johannes Kessler (1503–1574), em uma obra compilada sobre crônicas da Reforma Protestante denominada Sabbata, mais precisamente numa obra chamada Gerchichte der Taufe (História do Batismo) afirma que Conrad Grebel batizava por imersão, no caso aqui um ex-monge chamado Wolfgang Ulimann (? - 1528), que se tornou líder dos anabatistas, ele diz que Ulliman, quando batizado por Grebel teria sido imergido: “Wolfgang Uolimann, na sua viagem para Schaffhausen, encontrou Conrad Grebel, o qual o instruiu tão fortemente no conhecimento anabatista que ele não foi aspergido com um prato, mas foi mergulhado e coberto pelas águas do rio Reno”(3), mais uma vez corroborando a prática do imersionismo, agora por um dos pastores mais influentes do movimento anabatista da época da Reforma.
Ainda seguindo nesses testemunhos temos o bispo católico L´Abbe Fleury que em sua obra sobre história da igreja afirma: “Foi a chamada heresia dos anabatistas, porque este nome foi atribuído a tal seita... como muitos deles deram esse nome [batismo] a esse fato, mergulhar de novo na sagrada fonte, por isso eram chamados Anabatistas”(4), mais uma vez testemunhando sobre a imersão dentro dos anabatistas. Poderíamos também citar os anabatistas conhecidos como Collegiants (de origem remonstrante e dissidências dos menonitas), já citados como os que levaram a imersão a igreja de Jessey (igreja que deu origem a primeira igreja batista particular), dentre outros exemplos de relatos de batismos em rios com o modo da imersão. E também há algo mais a se destacar aqui: os anabatistas eram condenados e mortos com, geralmente, o chamado “terceiro batismo”, que consistia em executar a pessoa mergulhando-a num rio com pesos e correntes, modo com o qual foi, por exemplo, morto Felix Manz pelo governo reformado em Zurique afogado no rio Limmat42, o mesmo se encontra nas decisões dos magistrados de Zurique, conforme testemunha Zwinglio dizendo “O ilustre senado decreta: o que mergulha em água, se afoga em seu batismo, que primeiro aconteceu”(5) e também diz apoiando a decisão de afogar os anabatistas “Aquele que mergulha de novo, seja mergulhado” (6) Além disso, na própria Inglaterra, a igreja estatal era praticante do batismo por imersão, no Livro de Oração Comum, publicado em 1559, orienta que o rito seria “Então o sacerdote tomará a criança em suas mãos e perguntará o nome; e, nomeando a criança, deve mergulhá-lo na água, de modo que seja feito discreta e cuidadosamente dizendo: N. Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.Amém”(7). Sendo que o contexto da ascensão batista moderna na Inglaterra se dá dentro de uma igreja, pelo menos pela orientação oficial, imersionista. Não somente isso, puritanos como Vavasor Powell diziam que “As águas do batismo são solenes, significam imergir dentro, ou a lavagem do corpo com água no nome do Pai, [do Filho e do Espírito Santo] (Mt. 28:19). Significa a morte, o sepultamento e ressurreição de Cristo, também a limpeza espiritual e lavagem da justificação e regeneração ou santificação”(8). Entre os batistas, antes de 1644, podemos citar como exemplos de imersionismo alguns personagens entre os primeiros batistas. Começamos com Leonard Busher, um membro da igreja batista de Hewlys e Smyth, mas que aderia as questões soteriológicas particulares (batista particular), geralmente lembrado pela defesa batista da separação entre Igreja e Estado (veremos a seguir), mas “esquecido” na questão do batismo por imersão. Busher afirma, na sua obra Religious Peace or a plea for liberty of conscience de 1614 que “Cristo ordenou aos seus discípulos a ensinar a todas as nações, e batizá-los, isto é, pregar a palavra da salvação para toda criatura de toda sorte de nação que são dignas e desejam recebê-la. E então recebendo-a desejosamente e alegremente, Ele comandou batizá-los na água, isto é, imergir para a morte na água”(9), Busher era membro da Igreja Batista comandada por Thomas Hewlys (como vimos considerada a primeira igreja batista moderna). Além dele, sucedendo Hewlys no pastoreio, o pastor John Morton também afirma a imersão, numa anotação marginal no livro de E. Jessop, defendendo o credobatismo e a imersão ele diz “(Para vós) o batismo de Cristo é (o tipo de) coisa das quais (bebês) não são habilitados. (Nesse caso eles) seriam afogados como muitos (foram) na história, agora é feito uma nova (forma) para eles, (chamada) aspergir suas (cabeças) ao invés de imergir, (que) é o que a palavra batismo significa”(10). Na própria igreja JLJ, da qual se afirma sair o grupo que deu origem aos batistas particulares, a imersão já era praticada antes, é o que atesta Daniel Feathley, um antagonista dos batistas que diz que durante vinte anos, os batistas “se aglomeram em grandes multidões para seus Jordãos, e ambos os sexos entram no rio, e são mergulhados à sua maneira, com uma espécie de feitiço dentro da cabeça de seus princípios errôneos”(11), a obra é de 1645, o que coloca a imersão anterior a 1625. Até mesmo na igreja JLJ temos um documento da época de John Lathrop, ou seja, anterior a 1634, que fal das práticas imersionistas denominado o To Sions virgins:: or, A short forme of catechisme of the doctrine of baptisme, in use in these times that are so full of questions. (12), e não somente isso, após Lathrop, no pastoreio de Henry Jessey, Richard Blunt foi designado para ir de encontro ao anabatistas denominados Collegiants em 1642, dos quais recebeu o batismo por imersão e voltou a Inglaterra para batizar, por imersão, os membros junto com P. Barebone (13). Para recapitularmos a questão temos alguns fatos históricos aqui comprovados: 1) Que os anabatistas praticavam a imersão já antes no século XVI 2) Que na Inglaterra já se praticava a imersão, já antes no século XVI 3) Que os batistas já também tinham como modo de batismo a imersao, antes de 1644 4) Que até mesmo na origem dos batistas particulares a imersão já era praticada pelo menos um bom tempo antes de 1644, e a mesma fora trazida como modo correto por anabatistas holandeses (Collegiants)> Após todas essas asserções, é importante destacar a extrema necessidade de que, para afirmarmos as coisas inerentes a história, precisamos pesquisar, principalmente me fontes primárias ou próximas. Referências: (1) Sum of The Holy Scripture, Simon Fish (trad.), 1529, British Museum. 4401, b. 2. (2) Menno Simons, Opera, 1539, p. 24 apud Robert Robinson, History Of Baptism, p. 694-695, Nashville, 1860. (3) Johannes Kessler, Sabbatta, II, 266, apud Gerchichte der Taufe, p. 184. (4) L'Abbe Fleury, Historiae Ecclesiastiscs XXXIV, 282. (5) Zwinglio, Elenchus Contra Catabaptistas, 115, 364. (6) Zwinglio, 1526 apud Gerard Brandt, The History Of The Reformation In The Low Countries, 1671, Vol. I, p. 57. (7) Book Of Common Prayer, The Ministracion Of Baptisme To Be Used In The Churche, 1559. (8) Edward Bagshaw, The life and death of Mr. Vavasor Powell, that faithful minister and confessor of Jesus Christ wherein his eminient conversion, laborious successful ministry, excellent conversation are faithfully recorded for publick benefit, Londres, 1671, p. 35-41. (9) Leonard Busher, Religious Peace, A Plea For Liberty Of Conscience, Londres, 1614, p. 50. (10) John Morton apud William H. Burgess, John Smith, The Se-Baptist, 1911, 827. (11) Daniel Feathley, The Dipper Dipt, Epistle Dedicatory, 1645. (12) To Sions virgins:: or, A short forme of catechisme of the doctrine of baptisme, in use in these times that are so full of questions. By an antient member, of that long agoe gathered congregation, whereof Mr. Henry Jacob was an instrument of gathering it, and the pastour worthy of double honour, Mr. John Lathroppe succeeding him, now pastor in New England; and the beloved congregation, through Gods mercies sees her teachers, waiting when God shall give more liberty and pastours according to his own heart, praying the Lord of the harvest to thrust forth labourers into his harvest, ed. 1644. (13) J. H. de Hoop Scheffer, De Brownisten Te Amterdam Gedurende De Eerste Tijd Na Hunne Vestiging, 1881, p. 156. |
SOBRE O CHECAMOSO blog "Checamos" é um blog do Memória dos Batistas que repercute falas sobre história, doutrina e princípios batistas, afim de informar para a nossa audiência uma análise do que foi falado sobre o tema.
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